Como amplamente divulgado, foi publicada no Diário Oficial da União de 14 de julho de 2025 a Portaria MEC nº 506, de 10 de julho de 2025, que regulamenta o Decreto nº 12.456, de 19 de maio de 2025, no âmbito da oferta de cursos de graduação na modalidade de educação a distância (EaD) por Instituições de Educação Superior (IES).
A referida portaria disciplina aspectos essenciais da organização e da operacionalização dos cursos superiores EaD, com especial ênfase na formação acadêmica e nas atribuições do corpo docente, dos mediadores pedagógicos, dos tutores e dos responsáveis pelos Polos de Educação a Distância (Polos EaD).
Estabelece, ainda, diretrizes relativas às atividades presenciais obrigatórias, aos processos de avaliação da aprendizagem, à elaboração e disponibilização de materiais didáticos, bem como à utilização de plataformas digitais. O ato normative ainda define os critérios e os procedimentos para a criação, o funcionamento, a alteração de endereço e a extinção dos Polos EaD.
A edição da Portaria MEC nº 506/2025 amplia o arcabouço jurídico inaugurado pelo Decreto nº 12.456/2025, consolidando e aperfeiçoando o conjunto normativo que estrutura a nova política nacional da educação a distância. Complementa, nesse sentido, as disposições já estabelecidas pelas Portarias MEC nº 378/2025 e nº 381/2025, inserindo novos parâmetros e aperfeiçoando práticas anteriormente reguladas.
Ressalte-se, por oportuno, que, assim como no Decreto nº 12.456/2025, diversas previsões constantes da nova Portaria não representam inovações absolutas, uma vez que retomam e consolidam normativas anteriormente vigentes. Tais dispositivos foram, contudo, reorganizados, reiterados em sua aplicabilidade e integrados ao novo marco regulatório da EaD.
Considerando a estrutura da Portaria MEC nº 506/2025, passamos à análise de seus principais dispositivos, organizada por tópicos, com o objetivo de contextualizar os pontos centrais do normativo, identificar aspectos relevantes para a gestão acadêmica e administrativa das IES e apontar eventuais lacunas que, possivelmente, serão objeto de regulamentações complementares futuras.
DO CORPO DOCENTE E DOS MEDIADORES PEDAGÓGICOS
A nova Portaria MEC nº 506/2025 detalha as funções e atribuições dos distintos atores acadêmicos envolvidos na EaD, ao identificar e delimitar as responsabilidades dos profissionais. Em determinadas situações, tais atribuições não se enquadram, de forma estrita, nas atividades docentes propriamente ditas, o que pode ensejar discussões acerca da possibilidade de seu enquadramento no corpo técnico-administrativo, tal como já se verificava em normativas anteriores.
Nesse contexto, a Portaria reconhece expressamente, como integrantes desse quadro de profissionais vinculados à EaD:
- Coordenador de Curso
- Professor Regente
- Professor Conteudista
- Mediadores Pedagógicos
- Tutores
- Responsáveis pelos Polos EaD
As atribuições específicas de cada uma dessas funções estão descritas nos artigos 2º a 7º da referida Portaria. Contudo, ao invés de transcrevê-las, neste momento, mostra-se mais pertinente suscitar os questionamentos relacionados à correta interpretação dos dispositivos regulamentares, especialmente no que tange à obrigatoriedade de contratação, ao enquadramento jurídico das funções e à delimitação precisa de suas competências.
Tais definições, sem dúvida, terão repercussões relevantes nas negociações coletivas em curso, ou mesmo naquelas ainda não iniciadas, considerando os distintos interesses envolvidos por parte das IES e dos Sindicatos de Professores e demais profissionais da educação presentes nas diversas unidades federativas.
Adicionalmente, emergem dúvidas acerca da possibilidade de acumulação e aproveitamento de funções entre os agentes envolvidos, tema de especial relevância diante do impacto direto nos custos operacionais das instituições. A questão do acúmulo de funções demanda análise cuidadosa à luz das novas exigências normativas, sobretudo considerando o equilíbrio entre economicidade e qualidade acadêmica. Aqui, recomenda-se sempre a análise do caso concreto para a melhor estratégias jurídica e negocial.
As alterações introduzidas pelo novo marco regulatório revelam uma intenção clara de aprimorar os padrões de qualidade da educação a distância. Por outro lado, é igualmente notório que a maioria das IES sempre se manteve comprometida com padrões elevados de qualidade. Assim, a nova regulamentação poderá impor impactos significativos sobre os custos operacionais, exigindo das instituições um esforço de adaptação que deve ser cuidadosamente planejado.
Diante desse cenário, a composição do corpo docente e técnico-pedagógico suscita dúvidas e revela lacunas que ainda geram insegurança jurídica. Essas questões deverão ser sanadas por meio da edição de novos atos normativos complementares e, eventualmente, pela revisão de dispositivos atualmente em vigor, a fim de garantir maior clareza, segurança e aplicabilidade prática ao novo marco regulatório da educação superior a distância.
Exemplificando:
Como se enquadraria o Coordenador de Curso? Necessariamente teria que ser um docente, ou poderia se considerar que exerce funções de gestão, tendo em vista que as suas atribuições, na forma da Portaria, se assemelhariam mais à gestão do curso do que à docência propriamente dita? A literal interpretação da norma, permite, à primeira vista, estabelecer dois tipos de vínculo para o coordenador, podendo ser o mesmo remunerado como professor/hora aula, e receber, adicionalmente, remuneração fixa, como coordenador. Será preciso reavaliar os contratos de trabalho.
A mesma situação se amolda à figura do Professor Conteudista, cujas atribuições poderão ser assumidas pelo Professor Regente, desde que não ocorra conflito e queda na qualidade da ministração das aulas pelo último. É sabido que muitas IES se utilizam dos serviços do conteudista, apenas para elaboração de material acadêmico mediante contratação específica e pontual, não sobrevindo vínculo adicional. A redação do §2º do art. 3º da portaria suscita questionamentos quanto à exigência de vínculo formal do professor com a IES, pois a disposição excepciona apenas as atividades esporádicas de professor convidado, palestrante e membro de banca examinadora.
Também não resta claro qual o vínculo que o Responsável de Polo EAD deverá manter com a IES, desde o momento que subsiste a necessidade deve ser designado e capacitado pela IES, na forma da Portaria.
Esses aspectos representam apenas algumas das questões que têm gerado dúvidas e incertezas interpretativas, o que reforça a importância da atuação conjunta das entidades representativas do setor educacional junto à Secretaria de Regulação e Supervisão da Educação Superior (SERES/MEC), com vistas à construção de diretrizes que assegurem um mínimo de segurança jurídica nas contratações dos profissionais envolvidos na modalidade EaD.
Quanto à formação exigida, as regras não são novas. Contudo, é preciso estar atento aos novos instrumentos avaliativos, sempre mirando que a titulação em programas de mestrado ou doutorado continuará a influenciar significativamente os indicadores e conceitos atribuídos.
Da mesma forma, impõe-se atenção redobrada à compatibilização do novo marco regulatório com os instrumentos acadêmicos e institucionais das IES, sendo recomendável a imediata revisão dos Projetos Pedagógicos de Curso (PPCs), do Regimento Interno, dos contratos firmados e das estruturas dos Polos EaD, de modo a garantir plena conformidade às novas exigências legais e regulamentares.
III. DAS ATIVIDADES PRESENCIAIS E DAS AVALIAÇÕES DE APRENDIZAGEM
Ao tratar das atividades presenciais previstas tanto na Portaria MEC nº 506/2025 quanto no Decreto nº 12.456/2025, identificam-se situações complexas que podem, inclusive, suscitar questionamentos de natureza constitucional, especialmente no que se refere à possível violação do princípio da autonomia universitária, consagrado no art. 207 da Constituição Federal.
A menção a uma eventual afronta à autonomia institucional decorre, notadamente, da redação do art. 10 da Portaria, que estabelece a obrigatoriedade de que as unidades curriculares ofertadas tenham duração mínima de 10 (dez) semanas e incluam, ao menos, uma avaliação de aprendizagem presencial, conforme previsto também no art. 23 do Decreto nº 12.456/2025.
Tal exigência impacta diretamente o modelo pedagógico e de negócios das IES, uma vez que impõe condicionantes à organização acadêmica, o que, em tese, poderia configurar limitação à autonomia constitucionalmente assegurada.
Além das exigências já explicitadas, a Portaria ressalta, de forma expressa, que as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs) poderão definir atividades formativas que, obrigatoriamente, deverão ser realizadas de forma presencial, ampliando o escopo das obrigações além daquelas já previstas no texto da norma.
Diante disso, caberá às IES prever, de forma clara e detalhada nos Projetos Pedagógicos de Curso (PPCs), as atividades formativas obrigatoriamente presenciais, observando integralmente as orientações fixadas pelas DCNs. A norma também admite, como possibilidade, que tais atividades presenciais ocorram em ambientes profissionais ou em outros espaços reconhecidos como adequados ao processo de ensino-aprendizagem.
Por fim, merece especial atenção o fato de que as avaliações presenciais, embora obrigatórias, não poderão ser computadas na carga horária mínima dos cursos. Tal disposição poderá impactar significativamente a organização do calendário acadêmico anual ou semestral, exigindo ajustes estruturais e operacionais por parte das instituições.
DOS MATERIAIS DIDÁTICOS E DAS PLATAFORMAS DIGITAIS
No que se refere aos materiais didáticos e plataformas digitais, impõem-se a necessidade de adequação imediata ao nível de formação de forma a viabilizar o necessário e imprescindível desenvolvimento de competências dos alunos e profissionais da educação.
É essencial primar pela acessibilidade, diversidade de formatos de seus conteúdos, com o uso de tecnologias apropriadas; promover a incentivar a interatividade entre os discentes, o corpo docente e demais atores, como mediadores, oferecendo plataformas que se caracterizem como Ambientes Virtuais de Aprendizagem (AVA), meios de interação por videoconferência e repositories de acervos bibliográficos e de materiais didáticos, tudo com aprimoramento e desenvolvimento contínuo.
DOS POLOS DE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
A autonomia das IES para a criação de polos foi mantida, observados os limites quantitativos fixados na Portaria, mas deve haver previsão expressa de criação no PDI.
Toda criação de Polos deverá ser informada no sistema e-MEC no prazo máximo de 60 (sessenta dias) da data do ato de criação, onde deverão constar todas as informações exigidas e mencionadas na Portaria.
Neste diapasão, haverá a necessidade de adequação do sistema e-MEC, tendo em vista as inovações trazidas pelas novas regulamentações, esperando-se que tal ocorra num breve espaço de tempo.
Recomenda-se que qualquer disfuncionalidade do sistema seja alvo de abertura de demanda, de modo a resguardar a IES de eventual não cumprimento de prazo regulatório.
Com a edição da Portaria, abre-se a possibilidade de formalização de parceria para instalação de Polos em IES diversa credenciada exclusivamente para oferta de cursos no format presencial, desde que o local seja identificado e sejam atendidos todos os requisitos definidos no art. 19 da Portaria.
Uma dúvida que subsiste, é se Instituições participantes do mesmo grupo econômico, mas que possuam CNPJs ou nomenclaturas diferenciadas podem ter polos criados neste formato de parceria.
CONCLUSÃO
Conforme anteriormente exposto, diversas questões exigem esclarecimentos por parte dos órgãos reguladores. No entanto, é inegável que as alterações introduzidas não apenas pela Portaria MEC nº 506/2025, objeto central desta nota, mas também pelos demais atos normativos correlatos, evidenciam a necessidade premente de revisão e atualização de todos os instrumentos internos das IES.
Tal revisão abrange regimentos institucionais, manuais acadêmicos e administrativos, contratos de trabalho e de prestação de serviços educacionais, além da reestruturação dos Projetos Pedagógicos de Curso (PPCs), adequação da infraestrutura física e tecnológica, desenvolvimento de novos materiais e plataformas digitais, capacitação dos corpos docente e técnico-administrativo, bem como a implementação de mecanismos de monitoramento contínuo, com vistas à plena observância do novo arcabouço normativo.
Ressalte-se, ainda, que permanece pendente a edição, por parte do Ministério da Educação, dos novos instrumentos regulatórios destinados a orientar os processos de avaliação e suprir pontos ainda lacunosos da nova política da EaD.
A Covac Sociedade de Advogados permanece à disposição para auxiliar as IES nesse processo de transição normativa, oferecendo suporte jurídico-regulatório completo, desde a reestruturação documental até a interlocução estratégica com os órgãos do sistema federal de ensino.