Dr. José Roberto Covac Junior, sócio, e Drª. Israele Mendonça Rangel, advogada associada da Covac Sociedade de Advogados
Sabe-se que é antiga a discussão quanto aos requisitos para o gozo da imunidade prevista no artigo 195, parágrafo 7º, da Constituição Federal. No decorrer dos anos, foram estabelecidos diversos requisitos adicionais ao dispositivo constitucional via leis ordinárias. Entre estas legislações, cabe destacar a Lei 8.212/91, que veio dispor sobre os requisitos para gozo desta “isenção” de contribuições sociais em seu artigo 55 e alterações supervenientes (Leis 9.429/96 e 9.528/1997 e 9.732/1998).
A Lei 8.212/91 veio a ser alvo de ações judiciais ao fundamento de violação à exigência constitucional de lei complementar para regular a imunidade (inc. II, art. 146, CF/88), a exemplo o RE-RG 566.622/RS, e, paralelamente, pelas ADIs 2028, 2036, 2228 e 2621, também relacionadas ao tema. Essas ações tiveram o mérito julgado em 2017 e aperfeiçoado em dezembro de 2019, via aclaratórios.
Em 23 de fevereiro de 2017, na conclusão do julgamento do RE-RG 566.622/RS, o Supremo Tribunal Federal adotou a posição que exigia edição de lei complementar para regular os contornos materiais da imunidade. Na ocasião, fixou-se a tese relativa ao Tema 32 de Repercussão Geral, nos seguintes termos: “Os requisitos para o gozo de imunidade hão de estar previstos em lei complementar”.
Contudo, a tese de repercussão geral do Tema 32 foi reformulada pelo plenário do STF em razão dos embargos de declaração opostos nas ADIs 2028, 2036, 2228 e 2621, em que restou consignado que aspectos meramente procedimentais referentes a certificação, fiscalização e controle administrativo são passíveis de definição em lei ordinária, somente exigindo-se lei complementar para definição do modo beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas no art. 195, §7º, da CF, especialmente no que se refere à instituição de contrapartidas.
A reformulação da tese foi fixada no seguinte sentido: “A lei complementar é forma exigível para a definição do modo beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas pelo art. 195, parágrafo 7º, da Constituição Federal, especialmente no que se refere à instituição de contrapartidas a serem por elas observadas”.
Note-se que a “nova” redação dada à tese em nada alterou aquela fixada em 23 de fevereiro de 2017, qual seja, a de que as condições para gozo da imunidade devem estar previstas em lei complementar. Afinal, a nova redação apenas reafirma que a utilização de tal instrumento normativo é a forma exigível para fixação dos requisitos necessários à fruição da imunidade, os quais agora denominaram-se contrapartidas.
Na verdade, a tese fixada reafirma que os requisitos para fruição da imunidade devem estar previstos em Lei Complementar, o que está em plena harmonia com o disposto no artigo 146, inciso II da Constituição Federal.
Os dispositivos declarados como inconstitucionais foram entendidos como relativos à fixação dos contornos materiais da imunidade dessas entidades, ao dispor sobre o modo de ser beneficente que faria jus à benesse imunizante, porque aquelas normas foram editadas para estabelecer requisitos para que a entidade pudesse fruir da imunidade, ou seja, por demarcarem o objeto material da própria imunidade, especialmente no que se refere à instituição de contrapartidas a serem observadas por elas, devem ser tratados apenas por lei complementar.
Ademais, replicando o mesmo entendimento apresentado em face do artigo 55 da lei 8.212/91, o Supremo Tribunal Federal concluiu exame da ADI 4480, nesse momento analisando especificamente os dispositivos do mais recente normativo que trata do tema, a Lei 12.101/09, que por maioria de votos (vencido apenas o ministro Marco Aurélio, que dava provimento total), os ministros decidiram por julgar parcialmente procedente a ação para declarar a inconstitucionalidade de diversos dispositivos da lei, em especial as contrapartidas como bolsa de estudos e prestação de serviços gratuito para concessão do Certificado de Entidade Beneficente de Assistência Social (CEBAS).
De todo modo, manteve ainda a necessidade de certificação pelo Poder Público como forma de fiscalização e controle administrativo de aspectos meramente procedimentais, evitando assim o direito da imunidade para falsas entidades.
Em resumo, diante dos mencionados julgados do STF, podemos concluir que atualmente os requisitos exigíveis para fruição da imunidade insculpida no § 7º do art. 195 da CF/88 são aqueles listados no art. 14 do Código Tributário Nancional, até que seja editada lei complementar, acrescidos das normas procedimentais da Lei 12.101/09, mantendo-se a prerrogativa da necessidade de certificação para fazer jus ao direito da imunidade constitucional.