PARECER DA PROCURADORIA DE FAZENDA NACIONAL SOBRE O TEMA 32 – RE 566.622

A PGFN expediu a Nota SEI n.º 17/2020/COJUD/CRJ/PGAJUD/PGFN-ME, manifestando-se acerca do julgamento do Tema 32 do STF de 18/12/2019, firmando entendimento vinculante à matéria, em que há a autorização expressa para dispensa da própria PGFN de contestar, recorrer e impugnar, nos termos do art. 19, inciso V e VI, “a” da Lei n.º 10.522 / 2002, c/c art. 2º, inciso V da Portaria PGFN n.º 502/2016. 

Referido tema assentou o entendimento de que “a lei complementar é forma exigível para a definição do modo beneficente de atuação das entidades de assistência social contempladas pelo art. 195, §7º da CF, especialmente no que se refere à instituição de contrapartidas a serem por elas observadas”. 

No referido julgado, o Ministro Teori traça parâmetro objetivo para aferir a imunidade tributária do art. 195, §7º da CF, mencionando em seu voto sobre o que se caracterizaria “entidades beneficentes de assistência social”, aduzindo que o conceito de assistência social delimitado pelo art. 203 da CF e os respectivos serviços nele previstos é que valem para fins de aferição desse critério, além de esclarecer a diferenciação do conceito de entidade e instituição de educação sem finalidade lucrativa das entidades de assistência social, mencionando que a exigência de contrapartidas devem ser observadas por estas entidades, e isso que irá integrar o conceito de beneficência para se fazer jus ao art. 195, §7º. 

Assim, aplicando os fundamentos determinantes dos julgados – tanto das ADIs como do Tema 32 – chega-se às seguintes conclusões:  

  • matéria meramente procedimental, passível de revisão em lei ordinária: reconhecimento da entidade como utilidade pública; estabelecimento de procedimentos pelo CNAS para a concessão de registro e certificação – CEBAS; a escolha técnico-política sobre o órgão que deve fiscalizar o cumprimento da lei tributária referente à imunidade; a exigência de inscrição da entidade em órgão competente; a determinação de não percepção de remuneração e de vantagens ou benefícios pelos administradores, sócios, instituidores ou benfeitores da entidade e a exigência de aplicação integral do resultado na promoção dos objetivos institucionais da entidade; 
  • a delimitação do campo semântico “do modo beneficente de assistência social” sujeita-se à regra de reserva de lei complementar, nos termos do art. 146 da CF; 
  • a exigência de gratuidade total ou parcial na prestação dos serviços sociais é um elemento caracterizador do modo beneficente de atuação, o que atrai a regência de lei complementar; 
  • todas as outras previsões de contrapartida a serem observadas pelas entidades também demandam lei complementar; 
  • os arts. 4, 5 e 7 da Lei n. 9732/98 foram declarados formalmente nulos, demonstrando que o marco temporal para as condicionantes exigidas para a fruição da imunidade e o cancelamento da imunidade aos que descumprirem os requisitos restringem a extensão da imunidade e requerem regulamentação por lei complementar. 

Reconhece ainda a PGFN que o voto condutor das ações tramitadas na Corte Suprema serve de baliza para compreensão do que vem a caracterizar entidade beneficente de assistência social, mas que não está apto a enfrentar todas as dúvidas postas em relação a constitucionalidade das normas que trataram da temática durante todos esses anos, na medida que “a Constituição Federal não reúne elementos discursivos para dar concretização segura ao que se possa entender por modo beneficente de prestar assistência social; (c) a definição desta condição modal é indispensável para garantir que a imunidade do art. 195, § 7º, da CF cumpra a finalidade que lhe é designada pelo texto constitucional” (trecho extraído da ADI 2028) 

Assim, faz-se necessário, no caso concreto, o intérprete analisar as atividades prestadas pelas entidades no intuito de a diferenciar de meras instituições sem finalidade lucrativa, no sentido principalmente dos art. 6º e 203 da CF, que tratam dos direitos sociais dos cidadãos em prol dos economicamente mais vulneráveis. 

Ademais, essa consultoria jurídica compreende que as entidades beneficentes de assistência social, que possuem o CEBAS válido e vigente, já passaram por esse crivo do Estado, na medida que tiverem em procedimento próprio e específico para tanto, demonstrando todas as condições sine qua non para a fruição da imunidade tributária em relação às contribuições sociais, nos termos do art. 195, §7º da CF, uma vez que o Tema 32 do STF, alinhado às ADIs relacionadas ao tema, reconheceram que lei ordinária poderá dispor sobre matéria meramente procedimental. Quanto a isso não resta a menor dúvidas. 

Por sua vez, àquelas que não obtiveram a certificação durante todos esses anos, seja por não terem requerido, uma vez que possuíam motivo justo, na medida que o Estado requeria requisitos que hoje está pacificado serem formalmente inconstitucionais, podem hoje requerer esse reconhecimento, ainda que judicialmente, e garantir o direito à imunidade de contribuições sociais, seja pelo próprio indeferimento administrativo, caso este indeferimento tenha sido por algum motivo relacionado às inconstitucionalidades aventadas pelo STF no Tema 32. 

Veja, essas entidades, à época, não poderiam ter obtido o certificado sem o necessário cumprimento de requisitos considerados inconstitucionais pela Corte, por mais que promovesse atividades beneficentes nos termos da Constituição Federal. 

Ao analisar o histórico da legislação sobre a temática, vê-se que foram promulgados diversos decretos e medidas provisórias que interferiram no modo de atuação beneficente das entidades, e, portanto, havia motivo justo para o seu não requerimento administrativo. 

Por mais que o STF tenha considerado, em tese, a validade da certificação como forma de fiscalização do ente público no intuito de evitar entidades de fachada, ao mesmo tempo declarou a inconstitucionalidade de diversos dispositivos e artigos que de alguma forma interferiam no modo de atuação das organizações, em especial, as contrapartidas. 

Assim, não se nega a constitucionalidade do CEBAS, mas essa consultoria jurídica defende que, para todas as entidades, até o julgamento em definitivo da ADI 2028, não era possível o seu requerimento sem o cumprimento de exigências inconstitucionais, e, portanto, não pode ser exigida hoje, como prova do reconhecimento do direito, a imunidade no passado. No caso em concreto, para essas entidades, não tem validade. 

Por óbvio, caso um eventual indeferimento do certificado à época tenha sido por qualquer descumprimento do art. 14 do Código Tributário Nacional, não há o que se falar em ilegalidade dessa decisão, na medida que, caso a entidade não cumprisse os requisitos do art. 14 do CTN, estaria por descumprir exigências previstas em lei complementar, que, principalmente, são eficazes para comprovar a própria natureza da entidade: sem finalidade lucrativa e beneficente. Mas, ressalte-se, a ausência de requerimento de certificação em âmbito administrativo ou mesmo o seu indeferimento pelo não cumprimento das contrapartidas estabelecidas em legislação ordinária, não podem ser suficientes para impedir o direito constitucional à imunidade prevista no art. 195, §7º da CF. 

Por fim, é necessário, nesse caso em concreto, serem considerados todos os fatos e documentos apresentados, que comprovam a atividade beneficente da entidade, e, nos termos da própria Nota SEI nº 17/2020/COJUD/CRJ/PGAJUD/PGFN-M, estão dentro da ratio decidendi da ADI 2028, que a autoriza a dispensa de impugnaçõescontestações e recursos por parte do órgão fiscal. 

Bianca Heleno Monteiro de Simone e José Roberto Covac Junior 

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